Quando a família é tóxica, o que fazer?

Muito se fala sobre relações abusivas com amigos, pessoas do trabalho ou algum relacionamento amoroso. No entanto, é no seio familiar onde muitas vezes ocorre o primeiro contato com pessoas tóxicas. Quem nunca ouviu a premissa “tudo por a família”? Esse tipo de ideia pode funcionar como mecanismo de submissão a comportamentos e atitudes familiares prejudiciais.

Outra questão que aumenta a tolerância às relações familiares abusivas é a cultura. Tendo em vista que historicamente somos ensinados a preservar a família, atuando na manutenção de restrições e tabus. A cultura estabelece que só é permitido ter sentimentos positivos sobre a família. Tal imposição implica na repressão de sentimentos naturais do ser humano e na incapacidade em gerenciar conflitos.

Nesse sentido, o cenário ganha outro aspecto quando a vítima está em situação de dependência econômica, social ou emocional com a pessoa que exerce o abuso.

Como reconhecer uma família tóxica?

O conflito existe em todos os tipos de relacionamentos, porque interesses se chocam. Divergir se faz importante no sentido de realinhar expectativas e de pôr em constante análise as relações.

No entanto, existem relações que são mais difíceis e evocam constantemente o conflito ao invés da harmonia. É preciso mensurar o quanto de dor e sofrimento essa convivência traz. Desconforto, inferiorização, descrença, humilhação e abuso são alguns comportamentos que podem existir em uma relação tóxica dentro ou fora do ambiente familiar.

Como lidar com a situação?

Cada relação tem sua complexidade, então não há uma fórmula a ser replicada. A seguir, deixo algumas orientações do que pode ser feito com vínculos que não fazem bem:

1 – Busque ajuda profissional 

Se você vive sob angústia, em sofrimento e sente perda da dignidade por causa de um relacionamento familiar, busque uma escuta profissional. Um psicólogo ou psiquiatra pode ajudar você a descobrir a melhor solução.

2 – Você não pode mudar ninguém

Muitas vezes o sofrimento está na angústia de esperar que o outro mude, quando quem tem que mudar é você. Como? Realinhando suas expectativas sem esperar que o outro tome a atitude que você deseja. Lembre-se: você só é capaz de mudar os seus próprios comportamentos e atitudes. 

3 – Se preciso for, corte laços 

Na maioria dos casos, é sem dúvidas a escolha mais extrema e dolorosa, porque estamos falando de um ente amado. Diante do rompimento da relação, pode surgir o sentimento de culpa, principalmente porque memórias de situações passadas surgirão. É importante ter em mente o real motivo da sua decisão de se emancipar dessa pessoa. Sem essa definição clara, corre-se o risco de viver em ciclos numa relação abusiva e até mesmo repetir o padrão com outras pessoas.

A eletroconvulsoterapia é eficaz contra depressão e outros transtornos mentais; conheça o tratamento

Mais de 16,3 milhões de brasileiros sofrem com depressão, de acordo com dados da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) de 2019. Em relatórios anteriores, a Organização Mundial da Saúde já havia apontado o Brasil como o país com mais deprimidos da América Latina, com 5,8% da população diagnosticada com a doença. O avanço de doenças como a depressão é assustador – isso sem mencionar os casos não diagnosticados – mas a medicina avança com recursos terapêuticos cada vez mais eficazes e seguros. 

Nesse sentido, a Eletroconvulsoterapia (ECT) é um dos procedimentos mais antigos da medicina, com início datado em uma era pré-psicofarmacológica, na década de 30 do século 20. Quando comparado até mesmo com tratamentos mais modernos, a ECT se equivale como um dos mais eficazes e seguros. Isso pode ser demonstrado com a quantidade de indicações nas principais diretrizes de tratamento do mundo inteiro.

No tratamento da depressão, a ECT tem um papel central nos pacientes mais graves. Sob o procedimento, a probabilidade de remissão da doença, ou seja, de que um paciente deixe de apresentar sintomas depressivos, em duas semanas, é de 34%. Se estendermos para quatro semanas, o número aumenta para 75%. A ECT se mostra excelente para aqueles pacientes que estão em catatonia, inanição, ou que não podem esperar por uma melhora como aqueles com ideação suicidas. 

Isso ocorre porque a ECT promove uma reorganização do cérebro por meio da liberação dos principais neurotransmissores relacionados aos transtornos mentais, como a serotonina, noradrenalina, dopamina e glutamato. Ao contrário do que diz o senso comum, a ECT é um tratamento seguro e bem tolerado. Por muito tempo, o tratamento foi incompreendido e equivocadamente atrelado à métodos de tortura aplicados durante a ditadura militar do Brasil.  

Hoje, um procedimento de ECT é realizado com o paciente anestesiado e medicado com relaxante muscular. Portanto, durante a sessão, a pessoa estará dormindo. Do ponto de vista motor, aquelas convulsões dramatizadas em filmes não ocorrem mais. No entanto, o efeito acontece do ponto de vista neurológico. Além de pacientes com depressão, o ECT é indicado para psicoses, epilepsia e parkinson. 

Quanto aos efeitos colaterais são característicos pós-procedimento: dor de cabeça, dor muscular e amnésia. Esta amnésia é referente a fatos e memórias posteriores ao tratamento. O paciente não esquece memórias do passado, mas, é possível que memórias produzidas durante o tratamento sejam esquecidas. No entanto, este efeito regride ao longo das sessões, e raramente permanece ao longo dos meses.

É consenso na medicina que a eletroconvulsoterapia não deve ser usada como primeiro recurso em um tratamento, por outro lado, estudo publicado na JAMA Psychiatry, em 2018, sugere que a terapia deve ser lembrada ao paciente como uma possibilidade após duas tentativas sem sucesso de tratamento com medicamentos. Em entrevista ao G1, Eric Ross, principal autor do estudo e pesquisador da Faculdade de Medicina da Universidade de Michigan, diz: “Embora a escolha do tratamento seja pessoal, nosso estudo sugere que a eletroconvulsoterapia deve estar na mesa como uma opção realista logo na terceira rodada de tratamento”. 

Todo mundo precisa de terapia?

Hoje em dia a frase “todo mundo deveria fazer terapia para lidar com quem precisa de terapia e não faz” é muito compartilhada nas redes sociais. Ela é uma perspectiva interessante do ponto de vista da divulgação dessas ferramentas que auxiliam na saúde mental. Por outro lado, é uma tentativa falha de determinar quem deve ou não buscar auxílio de um psicólogo. 

Abordagens psicoterápicas são tratamentos e tem base científica. Cada uma, seguindo sua metodologia, tem o propósito de auxiliar o paciente a se conhecer melhor, definir o seu sofrimento e desenvolver estratégias  para resolvê-lo. Veja, isso não se restringe apenas ao tratamento de transtornos mentais, mas a tudo aquilo que incomoda o sujeito e causa desconforto emocional. 

Para identificar se um sofrimento psicológico está além do normal é preciso observar alguns sinais como: duração dessa angústia, intensidade, prejuízos  sociais causados por ela, além dos sintomas físicos e comportamentais como dores de cabeça e no corpo, desconforto gástrico, fadiga, oscilações de humor, irritabilidade , etc.

Sobretudo, o pontapé inicial da decisão de buscar ajuda especializada deve considerar a sua  vontade de estar engajado(a) nesse processo de autoconhecimento. Importante salientar que nenhuma terapia “conserta” o indivíduo, mas auxilia na lida com seus próprios sentimentos objetivando o bem-estar. 

Já em relação ao tempo e o esforço desprendidos no tratamento, são variações que dependem consideravelmente da resposta do paciente. Na Psicanálise, por exemplo, não existe o conceito de “alta” do analisante. Cada um decide até onde quer ir e se dá alta. Sendo assim, existe uma gama de possibilidades psicoterápicas, cada uma indicada para cada tipo de demanda. 

Portanto, não se deve impugnar ao outro um tratamento só porque você faz e é benéfico para você. Cada um tem o seu contexto, suas dores, limitações e necessidades. É por isso que é tão importante buscar um profissional da saúde mental ao invés de tentar resolver só ou com um amigo. O profissional é quem domina as técnicas e tem capacidade de aplicá-las.

Associação de Psiquiatria do Estado do Ceará sai em defesa da instalação de leitos psiquiátricos para internamento de pacientes em estado grave

No último 26 de julho, a Associação de Psiquiatria do Estado do Ceará (APEC) lançou nota oficial em apoio à instalação de leitos psiquiátricos para internamento de pacientes em estado grave no Ceará. O pronunciamento vem num momento em que a instalação de uma unidade de atendimento psiquiátrico é anunciada na região do Cariri Cearense. O empreendimento, chamado Núcleo de Saúde Mental, tem o foco de prestar atendimento integral à saúde de pacientes com transtornos mentais e dependência química e oferecer a oportunidade para uma reestruturação da vida dessa pessoa. A previsão de iniciar os serviços é julho de 2022. 

Na fundamentação da manifestação, a APEC considera normativas de âmbito federal para embasar o apoio. Em Nota Técnica de 2019, o Ministério da Saúde dispõe sobre novas diretrizes para a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) que acrescentam aos serviços já existentes,equipamentos como: Ambulatório Multiprofissional de Saúde Mental – Unidades Ambulatorias Especializadas; Hospital Psiquiátrico; Hospital-Dia. 

Outro destaque priorizado pela entidade é a Lei nº 10.216/01, mais conhecida como “Lei Antimanicomial”, que estabelece como  direito à saúde e proteção de pessoas com transtornos psiquiátricos. Nesse sentido, o pronunciamento da APEC menciona ainda as evidências científicas que relacionam diretamente o aumento de suicídios e criminalidade com a diminuição de leitos psiquiátricos. 

De acordo com o Ministério da Saúde, o Brasil conta hoje com uma cobertura deficitária nesta modalidade assistencial. Somando leitos em Hospitais Psiquiátricos e aqueles em Hospitais Gerais, há cerca de 0,1 leito por 1.000 habitantes, quando o preconizado pela própria Pasta seria de 0,45 por 1.000 habitantes. “[…] não podemos olhar os transtornos mentais de maneira simplificada ou romantizada. Estamos em uma epidemia de sofrimento emocional”, reforça a APEC no documento. 

Enfatiza-se também a obrigatoriedade da existência de Hospitais Psiquiátricos, como preconiza a Lei Antimanicomial. No pronunciamento, a APEC diz apoiar abertura de hospitais psiquiátricos no território cearense que atuem de forma humanizada e forneçam tratamento num tempo hábil de recuperação do paciente. Ainda, exprime total desaprovação às instituições que pratiquem os moldes manicomiais e institucionalizam o paciente psiquiátrico. 

O Núcleo de Saúde Mental do Cariri

O Núcleo de Saúde Mental está previsto para inaugurar em julho de 2022 na cidade do Crato, interior do Ceará. A estrutura foi projetada para expandir horizontal e verticalmente, de acordo com o crescimento da demanda por atendimentos. Inicialmente, serão 3.000m² de área construída, com 30 leitos em apartamentos duplos e/ou individuais, Pronto Atendimento com consultório médico e sala de observação. 

O objetivo é criar um ambiente terapêutico que possibilite o acesso do paciente a novas formas de se relacionar, com musicoterapia, yoga, educação física, campo, piscina. O serviço funcionará num modelo totalmente diferente do adotado antigamente. O foco é um tratamento baseado na clínica ampliada do sujeito, que trate o paciente como um todo e não apenas  os sintomas. Desta forma, é possível garantir a civilidade do paciente. 

“É possível haver internamento sem haver manicômio”; leia entrevista concedida ao Site Miséria 

Medicamentos psiquiátricos causam dependência? Conheça (e rompa) com os maiores estigmas sobre o assunto

Um grande impeditivo de pessoas buscarem um tratamento psiquiátrico  é o medo das medicações e suas reações. Muitas vezes, levam em conta informações falsas ou distorcidas e acabam colocando a saúde mental em último plano. Há o medo da dependência, de ficar incapacitado(a), de aumentar de peso, de passar a vida inteira tomando um remédio… O assunto é de fato cercado por dúvidas e inseguranças, mas isso provavelmente se deve ao histórico de antigas medicações  que geravam efeitos adversos  desconfortáveis aos pacientes. Felizmente, as últimas décadas foram de avanços significativos para a neurociência, inclusive no desenvolvimento de psicotrópicos mais modernos e eficazes. 

Devemos começar por um dos pontos mais importantes que é a definição de dependência. O Manual de Diagnóstico e Estatística da Associação Psiquiátrica Americana (DSM-IV) define a dependência como um padrão mal adaptativo do uso de substâncias, que leva a prejuízo ou sofrimento significativo, caracterizado pela presença de três ou mais dos critérios a seguir, pelo período de um ano: 

  • tolerância;
  • abstinência;
  • consumo por período de tempo mais prolongado e em quantidades maiores que o planejado; 
  • desejo persistente de uso e incapacidade para controlá-lo; 
  • muito tempo gasto em atividades para obtenção da substância;
  • redução do círculo social em função do uso da substância;
  • persistência do uso da substância, apesar de prejuízos clínicos.

Nesse sentido, muitas pessoas relacionam, de forma generalizada, os psicotrópicos à dependência química, pois acreditam que com a retirada do medicamento, o paciente sofrerá abstinência. O primeiro erro é acreditar que todos os fármacos prescritos por psiquiatras causam dependência. Antidepressivos, antipsicóticos, estabilizadores de humor, entre outros, não têm potencial de dependência. 

A classe de medicação que pode ter mecanismos de gerar dependência é a dos benzodiazepínicos, mais conhecidos como “receita azul” ou “tarja preta”. São medicamentos de grande importância para tratamento  agudo da ansiedade, ou seja, aliviar sintomas a curto prazo. São utilizados com muito critério médico e sim, podem apresentar perigos quando administrados de forma descontrolada, como no caso de pessoas que se automedicam. 

Muitos pacientes também temem que irão passar o resto da vida tomando um remédio ou queixam-se sobre a dificuldade de retirar o medicamento. O tempo de uso vai depender de cada transtorno e da gravidade dos sintomas. Não é que seja difícil parar, mas é o psiquiatra quem tem a competência de conduzir a estratégia de retirada da melhor maneira para não causar desconfortos ao paciente. 

No geral, na maioria dos casos, o tratamento medicamentoso é temporário. Somente em alguns casos, por serem refratários, resistentes ou crônicos, é necessário tratar sem previsão de alta porque o benefício será maior que o prejuízo. 

“O que deixa uma pessoa disfuncional é o transtorno mental e não a medicação. Estas, são usadas para corrigir qualquer déficit causado pelo transtorno psiquiátrico. No cenário brasileiro, dentre os 10 problemas de saúde mais incapacitantes, cinco são psiquiátricos.” 

Outro ponto permeado por estigmas é uma suposta improdutividade causada por antidepressivos. O que deixa uma pessoa disfuncional é o transtorno mental e não a medicação. Estas, são usadas para corrigir qualquer déficit causado pelo transtorno psiquiátrico. No cenário brasileiro, dentre os 10 problemas de saúde mais incapacitantes, cinco são psiquiátricos. 

Há muitos mitos, inverdades e desinformações espalhadas por aí sobre assuntos relacionados à saúde mental. Por outro lado, estamos trilhando um caminho de conscientização sobre a importância de um olhar atento às questões da saúde mental. Toda e qualquer medicação precisa ser recomendada por um profissional da saúde qualificado para tal ato. Por fim, o estigma sobre o uso de psicofármacos precisa ser superado, tendo em vista que doenças psiquiátricas precisam de tanta atenção e cuidado quanto qualquer outro adoecimento.