A crise silenciosa da saúde mental dos homens

Um estudo sobre mortalidade por suicídio no Brasil, divulgado pela  Secretaria de Vigilância em Saúde no anos de 2019, traz o dado alarmante de que homens apresentam um risco 3,8 vezes maior de morte por suicídio do que mulheres. Esse resultado traz à tona o silenciamento entorno da questão: saúde mental do público masculino. Por que homens estão mais propensos ao suicídio e como podemos tratar a problemática?

De acordo com o mesmo estudo, os fatores associados à alta nos números indicam que os homens têm uma maior agressividade e maior intenção de morrer. Dentre as causas, o documento indica: “(…)maior acesso a armas de fogo e outros objetos letais, e maior suscetibilidade aos impactos de instabilidades econômicas entre homens. Essas pistas evidenciam que os padrões de masculinidade estão diretamente associados com a baixa busca por cuidados mentais. 

Em um outro estudo, publicado em 2021, os autores Silva e Melo explicam: “os homens parecem engajar-se em comportamentos como o abuso de álcool, a tomada exagerada de risco e a violência devido a um fenômeno descrito na psicanálise como “acting-out”.”. Em síntese, este fenômeno indica ações impulsivas que uma pessoa pode ter que contradizem seu comportamento comum. Geralmente, surgem agressivamente e são um sinal de algo recalcado, ou seja, algum sentimento/pensamento/desejo/problema evitado ou omitido por essa pessoa. 

Outro ponto que parece ser o maior impeditivo de homens buscarem ajuda para o sofrimento mental é a tendência em associar doença à fraqueza. Fica evidente que os homens continuam reféns dos padrões de masculinidade e isso os torna mais propensos a negligenciar a própria saúde. Nesses casos, o primeiro passo é olhar para si como um ser humano, sem rotulações, que precisa de cuidados e tomar o maior ato de coragem: falar sobre seus problemas e sentimentos. Para se sentir mais amparado, é ideal buscar uma rede de apoio, seja um amigo ou a própria família, e, sobretudo, um profissional da saúde mental para acompanhar o caso e ajudar na evolução do quadro.  

Para amadurecer as emoções é preciso nomear os sentimentos

Você consegue diferenciar tristeza de angústia ou ansiedade? Ou alegria de euforia? Identificar sentimentos é algo particularmente difícil para as crianças, mas também para muitos adultos. Isso porque ainda existe dificuldades – e tabus – para falar sobre sentimentos. O problema é que a falta de auto percepção pode levar ao silenciamento das nossas próprias emoções e a consequência disso é o sofrimento emocional. 

Retomamos à infância. Tente recordar: em algum momento, quando criança, você foi ensinado(a) a nomear e identificar seus sentimentos? É nesse período da vida que começamos a entender sensações e ter noções de mundo. Sem a devida educação emocional, dificilmente essa pessoa se tornará um adulto consciente sobre o próprio sentir. 

Como entender melhor os próprios sentimentos? 

Uma forma simples é elaborar uma lista com diversos sentimentos e tentar encontrar definições e exemplos para cada item. Vale, inclusive, buscar as definições na internet, com outras pessoas e até em livros que se dedicam ao tema.

Em casos de mudança de humor ou um conflito, outro exercício indicado é escrever a situação, quem estava presente, que você pensou naquele momento e até alterações físicas. Uma espécie de diário emocional. Isso vai ajudar a, posteriormente, você enxergar a situação de um outro ângulo. 

Terapia

É comum encontrar nos consultórios adultos que chegam com diversos nós emocionais originados na dificuldade de nomear o que estão sentindo. A terapia, muitas vezes, se torna desconfortável para essas pessoas quando inicia o processo de descoberta de emoções difíceis como raiva, ódio, inveja e tristeza. 

Pessoas que não tiveram acolhimento ou espaço para expressar o que sentiam na infância não são adaptadas ao entendimento de que sentir, qualquer que seja a emoção, é parte de ser humano. Independente de juízo de valor, as emoções nos chegam. 

Por isso, é importante destacar que a terapia não faz desaparecer sentimentos incômodos ou traz uma receita para “a cura”. A terapia é uma ferramenta importante que vem ajudar a encontrar mecanismos para gerenciar melhor as próprias emoções. 

Quando a família é tóxica, o que fazer?

Muito se fala sobre relações abusivas com amigos, pessoas do trabalho ou algum relacionamento amoroso. No entanto, é no seio familiar onde muitas vezes ocorre o primeiro contato com pessoas tóxicas. Quem nunca ouviu a premissa “tudo por a família”? Esse tipo de ideia pode funcionar como mecanismo de submissão a comportamentos e atitudes familiares prejudiciais.

Outra questão que aumenta a tolerância às relações familiares abusivas é a cultura. Tendo em vista que historicamente somos ensinados a preservar a família, atuando na manutenção de restrições e tabus. A cultura estabelece que só é permitido ter sentimentos positivos sobre a família. Tal imposição implica na repressão de sentimentos naturais do ser humano e na incapacidade em gerenciar conflitos.

Nesse sentido, o cenário ganha outro aspecto quando a vítima está em situação de dependência econômica, social ou emocional com a pessoa que exerce o abuso.

Como reconhecer uma família tóxica?

O conflito existe em todos os tipos de relacionamentos, porque interesses se chocam. Divergir se faz importante no sentido de realinhar expectativas e de pôr em constante análise as relações.

No entanto, existem relações que são mais difíceis e evocam constantemente o conflito ao invés da harmonia. É preciso mensurar o quanto de dor e sofrimento essa convivência traz. Desconforto, inferiorização, descrença, humilhação e abuso são alguns comportamentos que podem existir em uma relação tóxica dentro ou fora do ambiente familiar.

Como lidar com a situação?

Cada relação tem sua complexidade, então não há uma fórmula a ser replicada. A seguir, deixo algumas orientações do que pode ser feito com vínculos que não fazem bem:

1 – Busque ajuda profissional 

Se você vive sob angústia, em sofrimento e sente perda da dignidade por causa de um relacionamento familiar, busque uma escuta profissional. Um psicólogo ou psiquiatra pode ajudar você a descobrir a melhor solução.

2 – Você não pode mudar ninguém

Muitas vezes o sofrimento está na angústia de esperar que o outro mude, quando quem tem que mudar é você. Como? Realinhando suas expectativas sem esperar que o outro tome a atitude que você deseja. Lembre-se: você só é capaz de mudar os seus próprios comportamentos e atitudes. 

3 – Se preciso for, corte laços 

Na maioria dos casos, é sem dúvidas a escolha mais extrema e dolorosa, porque estamos falando de um ente amado. Diante do rompimento da relação, pode surgir o sentimento de culpa, principalmente porque memórias de situações passadas surgirão. É importante ter em mente o real motivo da sua decisão de se emancipar dessa pessoa. Sem essa definição clara, corre-se o risco de viver em ciclos numa relação abusiva e até mesmo repetir o padrão com outras pessoas.

Todo mundo precisa de terapia?

Hoje em dia a frase “todo mundo deveria fazer terapia para lidar com quem precisa de terapia e não faz” é muito compartilhada nas redes sociais. Ela é uma perspectiva interessante do ponto de vista da divulgação dessas ferramentas que auxiliam na saúde mental. Por outro lado, é uma tentativa falha de determinar quem deve ou não buscar auxílio de um psicólogo. 

Abordagens psicoterápicas são tratamentos e tem base científica. Cada uma, seguindo sua metodologia, tem o propósito de auxiliar o paciente a se conhecer melhor, definir o seu sofrimento e desenvolver estratégias  para resolvê-lo. Veja, isso não se restringe apenas ao tratamento de transtornos mentais, mas a tudo aquilo que incomoda o sujeito e causa desconforto emocional. 

Para identificar se um sofrimento psicológico está além do normal é preciso observar alguns sinais como: duração dessa angústia, intensidade, prejuízos  sociais causados por ela, além dos sintomas físicos e comportamentais como dores de cabeça e no corpo, desconforto gástrico, fadiga, oscilações de humor, irritabilidade , etc.

Sobretudo, o pontapé inicial da decisão de buscar ajuda especializada deve considerar a sua  vontade de estar engajado(a) nesse processo de autoconhecimento. Importante salientar que nenhuma terapia “conserta” o indivíduo, mas auxilia na lida com seus próprios sentimentos objetivando o bem-estar. 

Já em relação ao tempo e o esforço desprendidos no tratamento, são variações que dependem consideravelmente da resposta do paciente. Na Psicanálise, por exemplo, não existe o conceito de “alta” do analisante. Cada um decide até onde quer ir e se dá alta. Sendo assim, existe uma gama de possibilidades psicoterápicas, cada uma indicada para cada tipo de demanda. 

Portanto, não se deve impugnar ao outro um tratamento só porque você faz e é benéfico para você. Cada um tem o seu contexto, suas dores, limitações e necessidades. É por isso que é tão importante buscar um profissional da saúde mental ao invés de tentar resolver só ou com um amigo. O profissional é quem domina as técnicas e tem capacidade de aplicá-las.

Borderline, paranoide, dependente: Você conhece os Transtornos de Personalidade? Saiba os 10 tipos, grupos e padrões

Todos nós apresentamos singularidades, padrões de pensar, sentir e se comportar socialmente. Esse conjunto de características psicológicas é o que molda a personalidade de cada um. Traços da personalidade de um indivíduo se mantém, de certa forma,  constante ao longo da vida e se manifestam em inúmeras ocasiões. Já o temperamento, um dos aspectos da personalidade, é inato ao ser humano, ou seja, pertence ao indivíduo  desde o nascimento, e caracterizam as particularidades ligadas ao comportamento. Nessa composição, há, no entanto, o caráter, aspecto moldado basicamente pela cultura e educação. Com isso, entende-se que a personalidade é um processo gradual, resultado de interações entre aspectos particulares e os aprendidos socialmente.  

No caso dos Transtornos de Personalidade (TP) há muito mais do que traços: os indivíduos se caracterizam por um padrão de comportamento mal adaptativo, profundamente enraizado e rígido que causa sofrimento significativo ou comprometimento funcional. No entanto, é importante destacar que dependendo da cognição, juízo crítico, conhecimento e disposição ao entendimento, tais estados supostamente pétreos podem seguir por caminhos mais favoráveis e de menor sofrimento. É possível adaptar a maneira de ser, disciplinar pulsões, esquemas de pensamentos e impulsos específicos desses transtornos, com possível melhora na qualidade de vida.

Diversos critérios definem os transtornos de personalidade, que variam significativamente em suas manifestações. Os padrões costumam se iniciar na infância e não são explicados por alterações fisiológicas, mas sim, por uma combinação de fatores genéticos e ambientais. Segundo o DSM-5, o “Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais”, os 10 tipos de Transtornos de Personalidade são divididos em três grupos. No primeiro, as pessoas são  caracterizadas essencialmente por pensamentos estranhos, comportamentos excêntricos e mórbida tendência ao isolamento.
 Já o segundo grupo têm em comum um comportamento com tendência à dramaticidade, apelação e emoções que se expressam intensamente.
 No terceiro, estão as personalidades com marcantes traços de dificuldade no controle dos impulsos.

  • Grupo A: 

Paranoide

Caracterizado por um padrão de desconfianças e suspeitas injustificadas. Sempre interpretam as intenções e motivos do outro como maliciosos. Pessoas paranóicas tendem a ser hostis e desapegadas.

Esquizóide 

O desinteresse pelo outro é a tônica do transtorno de personalidade esquizóide. Não desejam, nem desfrutam de relações estreitas nem mesmo com a família. O comportamento geralmente começa no início da vida adulta. 

Esquizotípica 

Crenças estranhas e comportamentos excêntricos. O paciente com transtorno de personalidade esquizotípica apresenta distanciamento afetivo e comportamento nitidamente peculiar. Tem traços semelhantes à esquizofrenia. Geralmente acreditam em habilidades extra sensoriais e em eventos de magnitude mundial estão ligados a ele. 

  • Grupo B 

Antissocial 

Nesta condição, a pessoa não se conecta aos sentimentos e necessidades do outro. Também podem ter o costume de mentir, agredir, cometer práticas ilegais e tentar manipular. 

Histriônica 

Necessidade de chamar atenção para si é um traço importante do transtorno de personalidade histriônica. Comumente, a pessoa faz isso de forma dramática, provocadora ou sedutora.

Borderline 

O borderline se caracteriza pela forte desregulação emocional. Excessivo medo de abandono, relacionamentos intensos e instáveis, explosões emocionais, comportamento autodestrutivo e sentimento profundo de vazio são sintomas característicos desta condição que é também conhecida como limítrofe. 

Narcisista 

A pessoa sente necessidade constante de admiração, não tem empatia e carrega a crença de que os outros a  invejam. Neste caso, são pessoas extremamente vulneráveis à críticas e têm a autoestima abalada facilmente. 

  • Grupo C

Esquiva

Podem ser pessoas extremamente tímidas, receosas e sensíveis. Evitam interações sociais e sentem-se muito fragilizadas quando julgadas negativamente pelos outros. Vivem em constante sentimento de inadequação. 

Obsessivo-compulsiva

Regras, ordem e perfeccionismo exagerados são práticas de uma pessoa com personalidade obsessivo-compulsiva – também conhecido como anancástica. Essas pessoas tendem a ser solitárias  em seus esforços e desconfiam da ajuda de outros. 

Dependente 

Esta condição causa sintomas como a necessidade de ser cuidado/a, medo de estar só, dificuldades em se separar das pessoas queridas ou tomar decisões por conta própria. Além disso, a carência extrema pode ocasionar atitudes desagradáveis para chamar atenção. Tende a ser uma pessoa submissa e tolerar relações abusivas. 

TPs não definem essência

Reforçamos aqui que as classificações não se tratam de uma ânsia da psiquiatria em categorizar pessoas. Elas dizem respeito à forma da personalidade e não ao conteúdo psíquico e vivencial de cada um. Quer dizer, as classificações falam sobre maneiras do indivíduo ser e de reagir à sua vida, ou seja, como é funcionalmente esse indivíduo. Os conteúdos vivenciais definem quem é essa pessoa. Uma pessoa obsessiva, meticulosa, perfeccionista e rígida com problemas de adaptação, por exemplo, pode mudar sua maneira de ser, refazendo algumas crenças pessoais e atitudes comportamentais no sentido de construir melhor relação consigo mesma, com os outros e com a vida, embora continue sendo menos obsessiva, menos meticulosa, menos perfeccionista e menos rígida.